Fazer compras sempre foi, ao longo da história, uma experiência sensorial. O vendedor auxiliava o cliente na escolha dos produtos, atuando como “personal shopper”. O cliente avaliava a qualidade do produto com base em seu aspecto; pedia a opinião do vendedor ao provar uma roupa. A experiência de comprar não era apenas física, tátil; era emocional também.
Essa experiência tradicional e personalizada é difícil de reproduzir no ambiente online. À medida que mais empresas lutam para encontrar seu nicho junto ao consumidor moderno, elas se voltam para o uso de novas tecnologias a fim de recriar aquela experiência sensorial. Está surgindo o que eu chamo de “StoreHouse” — um modelo híbrido que une os benefícios materiais de uma loja física à comodidade do lar. Para aderir a essa mudança de mercado, as lojas de varejo terão de testar uma variedade de tecnologias e estratégias nas áreas de marketing, merchandising e cadeia de suprimentos. Veja como algumas marcas já estão fazendo isso:
Transformando o quarto no novo provador
Quando a fabricante de óculos Warby Parker surgiu em 2010, seus fundadores tinham um capital semente de US$2.500, além de uma impressionante formação em negócios. Graças à oportuna publicação de uma matéria na Vogue e a um conceito inovador — experimente óculos a preços acessíveis, virtualmente ou em casa, com frete grátis e possibilidade de devolução — a empresa obteve, num período de cinco anos, uma valorização de US$1,2 bilhão com as rodadas de financiamento da série A à D.
Outros se concentraram no desejo de escolha do consumidor. A Rent the Runway possibilita às clientes navegar pela sua coleção online de vestidos e emprestar um modelo por alguns dias, com a opção gratuita de um segundo vestido em numeração diferente. Recentemente, a Amazon anunciou um novo serviço, o Prime Wardrobe, que permite aos clientes selecionar de 3 a 15 itens de vestuário e experimentá-los por até sete dias, com frete grátis e devolução dos itens que eles optarem por não comprar.
Marcas como essas sabem que os clientes mais informados buscam a comodidade da compra online sem abrir mão da experiência que uma loja física lhes proporciona. Eu chamo essa tendência de “bracketing” — a compra de várias versões de um mesmo produto com a intenção de escolher a que mais agrade e devolver as restantes — basicamente transformando o quarto num provador. No futuro, mais marcas seguirão o exemplo da Amazon, Warby Parker e Rent the Runway, adotando o bracketing como uma oportunidade de conquistar a confiança dos clientes ao assegurar que eles encontrem os produtos certos.
Comprando virtualmente com a realidade aumentada
Ao contrário de óculos e roupas, certos produtos não podem ser experimentados e devolvidos com facilidade. Nas categorias de móveis e cosméticos, por exemplo, as lojas estão testando outros modos de oferecer experiências sensoriais. A IKEA acabou de lançar um aplicativo de realidade aumentada que permite aos consumidores visualizar e posicionar móveis virtuais em casa. A Sephora, veterana com experiência de 50 anos na indústria de cosméticos, permite aos clientes comprar facilmente de qualquer lugar com seu popular aplicativo Virtual Artist. Com esse aplicativo é possível experimentar mais de mil cores de blush por meio do upload de fotos, da realidade aumentada e da inteligência artificial.
Se um cliente consegue comprar móveis sem sair de casa ou experimentar blush sem manchar o rosto, imagine o que mais é possível! E se você pudesse comprar um anel de noivado apenas fazendo upload de uma foto da mão do seu parceiro, ou medir e posicionar uma peça de arte em sua sala de estar apenas usando o smartphone? Há um enorme potencial para reproduzir importantes experiências de compra do mundo real com o uso da realidade aumentada.
Melhorando a experiência do cliente por meio da logística
Descobrir e experimentar produtos é apenas uma parte da experiência de comprar; as lojas precisam oferecer opções de entrega adequadas à vida dos consumidores. Os clientes querem que os móveis da sala de jantar que eles escolheram usando o aplicativo de realidade aumentada da IKEA sejam entregues em casa sem complicação, com a mesma comodidade de chamar um Uber. Eles também querem opções. Se a Rent the Runway não pode entregar o vestido a tempo para o casamento do seu amigo, será que você pode buscá-lo na loja, então?
A complexidade que acompanha esse novo paradigma de vendas, em que cada lar é uma filial de loja, demanda um nível maior de sofisticação nas operações de retaguarda. As marcas que não tiverem uma estratégia bem elaborada de envio e entrega pagarão o preço — literalmente. Estima-se que o envio de uma embalagem do detergente para roupas Tide Pods de Atlanta a Oklahoma City custa às empresas cerca de US$11,44 — mais do que o próprio detergente.
No futuro, a gestão inteligente de estoque e a análise da cadeia de suprimentos poderão corrigir isso. Digamos que uma loja de móveis queira enviar uma cômoda de Chicago a Los Angeles. Isso leva cinco dias a um custo de US$50. A transparência na cadeia de suprimentos pode revelar que uma loja em Santa Mônica acabou de receber aquela cômoda e pode entregá-la hoje por US$25. Um modelo de entrega pautado pela eficiência e boa comunicação produz o mesmo efeito que um vendedor sorridente ao embalar o produto do cliente — uma agradável experiência que gera fidelidade.
No decorrer dos últimos 20 anos, a internet se tornou a porta da frente das lojas. Agora, esse ponto de entrada está rapidamente migrando para os dispositivos móveis, sobretudo com o advento dos assistentes pessoais ativados por comandos de voz e outros dispositivos com acesso à internet. Novas tecnologias estão ajudando as marcas inovadoras a tornar essa transição mais fácil, à medida que os consumidores trocam os shopping centers pela experiência de trazer as lojas para dentro de casa. As empresas que não descobrirem um modo de realizar um casamento feliz entre a experiência de showroom que se espera encontrar numa loja e a comodidade da compra online feita no conforto do lar serão deixadas para trás.
Fonte: Harvard Business Review