Uma fila de cerca de 1.500 pessoas aguardava ansiosamente pela abertura das portas da primeira filial brasileira da Forever 21, há pouco mais de três anos. Na época, o estoque da loja que era para durar três meses durou três semanas e a varejista teve de correr para atender a avidez das consumidoras.
A marca chegou ao país ostentando a fama e atratividade dos preços populares que pratica nos Estados Unidos. Lá, é comum encontrar peças sendo vendidas a menos de dez dólares.
Hoje, com preços ligeiramente mais altos e 31 lojas, a rede ainda reúne filas de espera pelas cidades por onde chega. Mas, passada a euforia, fica de frente – em geral, literalmente – à concorrência nacional.
A adaptação de preços não foi a única mudança desde que o negócio chegou ao Brasil e, para especialistas em varejo, ela ainda precisa sair da zona de conforto para manter a posição que conquistou.
De uma América a outra
A chegada da empresa ao mercado brasileiro não envolveu grandes mudanças de padrão. Além da ofensiva de preços já conhecida, a companhia também investiu em pontos caros e atrativos assim como faz no exterior.
A proposta de frequente rotatividade de estoque, característica do modelo fast fashion, também não ficou para trás – embora aparente funcionar em um ritmo um pouco menor aqui do que lá fora.
Sua política de preços, na época, foi posta em dúvida pelo mercado. Para muitos, ela se tornaria impraticável em meio à carga tributária brasileira.
Após uma recepção com preços mais baixos que a média praticada pelo setor, quem frequenta as lojas da rede de fato viu os valores nas etiquetas crescerem com o passar do tempo.
Mas os impostos não foram o único fator a pesar. Em 2014, o comércio varejista teve seu menor crescimento em 11 anos, 3,7%. Um ano depois, as vendas recuaram ainda mais, 4,3%. A inflação alta e a variação do câmbio também entraram para a conta.
“A Forever 21 entrou no país com uma margem menor de preços para entender até onde seria bem aceita. Desde então, fez reajustes em relação às concorrentes”, aponta Ana Paula Tozzi, CEO da AGR Consultores.
Ela avalia que o negócio está bem posicionado desde então e que, passada a euforia inicial, entrou em uma fase de maturidade em relação ao mercado brasileiro.
Segundo dados da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo, o faturamento bruto da operação no Brasil foi de 440 milhões de reais em 2015. Naquele ano, ela empregava 1.865 pessoas no país e faturava 15,7 milhões de reais por loja.
Porém, na opinião de Cláudio Tomanini, professor da FGV e consultor em gestão estratégica, o sucesso esperado pela varejista era ainda maior. Para ele, a companhia apostou alto no país com base no alto volume da marca consumido pelos brasileiros nos Estados Unidos.
“Os empresários viram uma oportunidade de investir e faturar no Brasil o mesmo que conseguiam por meio das lojas americanas. Tiveram sucesso, mas ainda estão longe de atingir por aqui o volume que vendem por lá”, afirma.
Jeitinho brasileiro
Característica do fast fashion, a ideia de produtos “descartáveis” – seja pela moda passageira ou pela menor durabilidade dos produtos – é fortemente ligada à rede desde sua chegada ao país. E, na época, questionou-se como seria a aceitação dos brasileiros.
Na visão de Marcos Gouvêa de Souza, diretor-geral do Grupo GS&, o apelo de “estar na moda” foi suficiente para que o conceito pegasse por aqui. “Em geral, os consumidores desse tipo de moda estão dispostos a pagar menos por um produto que sabem que não irá durar tanto”, afirma.
O perfil de consumo no Brasil, porém, é diferente do visto lá fora, tanto entre os americanos quanto entre os turistas brasileiros.
“Há uma diferença econômica, já que os Estados Unidos têm um mercado em que as pessoas têm sacolas nas mãos todos os dias”, destaca Ana Paula Tozzi. Segundo ela, essa diferença de perfil impede que a marca ouse mais em seus produtos e vitrines.
“Basta imaginar o lançamento de uma jaqueta de plástico vermelha. Você não consegue usar isso no Brasil, e nossa economia não permite que alguém compre uma peça dessas para usar por três dias”, explica.
A questão do crédito também tem um grande peso, conforme destaca Gouvêa. Segundo ele, a cultura de financiamento a prazos mais longos, diferente do que é visto nos EUA, cria uma dificuldade adicional às empresas estrangeiras.
Em relação ao consumo brasileiro nas filiais do exterior, também é preciso rever parâmetros de comparação.
“Enquanto lá se compra por oportunidade, aqui se compra por necessidade e um leve impulso. É, de fato, um mercado de competição”, aponta Tomanini.
Segundo ele, a expectativa de sucesso e disseminação semelhantes ao visto lá fora fizeram com que a Forever pecasse em alguns aspectos. A comunicação é um deles.
Quem esperava encontrar uma versão em português do site da marca, por exemplo, ainda está esperando. Mesmo após três anos, o único canal adotado no país foi uma página no Facebook – que, vale citar, tem atualizações pouco frequentes e um baixo índice de engajamento.
“As ações de mídia e de comunicação foram e ainda são muito baixas. É preciso considerar que ainda há uma parcela que não sabe o que é a ‘Forever vinte e um’”, aponta o consultor.
Concorrência acirrada
A chegada do negócio aos shoppings e pontos nobres do país causou incertezas em relação aos principais varejistas de moda do país. O mercado, dominado por lojas como Renner e Riachuelo, ganhava um fator altamente competitivo.
O resultado disso foi um desafio para os dois lados, ambos pressionados a se adaptar um ao outro ao longo desses três anos.
“As concorrentes entenderam a necessidade de renovação constante e garantia de estoques nas lojas. A competitividade foi muito positiva em relação a isso”, aponta Ana Paula Tozzi.
Segundo ela, logo de início, a rede americana contou com uma vantagem: enquanto as brasileiras se esforçam para se posicionar como varejistas de moda – adotando, por exemplo, produtos assinados por nomes famosos –, a Forever 21 já é vista como uma.
Essa aura internacional, no entanto, também traz desafios. Segundo Gouvêa, a posição faz com que o consumidor entre nas lojas com um nível de expectativa muito alto.
Esse fator colabora, inclusive, para que sua posição geral no mercado ainda seja meio ambígua. Menos “popular” que os nomes brasileiros, mas não tão “premium” quanto marcas como a Zara, a varejista parece ter ficado em um limbo ainda descaracterizado.
“Falta uma escala em que ela se encaixe em relação às concorrentes. Por isso a dificuldade maior em competir, apesar de ser eficiente em muito do que faz”, completa o consultor, que acredita que a companhia já está em busca de atingir essa escala.
“Zara e Forever 21 tem posicionamentos distintos, mas talvez a segunda possa trabalhar por esse flanco: não apenas vender mais barato, mas vender melhor”, analisa José Roberto Martins, consultor da Global Brands.
Próximos passos
Para Ana Paula Tozzi, os ajustes não devem parar por aí. A consultora enxerga o crescimento da tendência do slow consume – uma “modalidade” mais consciente e menos ávida por compras constantes – e acredita que a Forever deve se adaptar a isso do seu jeito.
Ela aposta, ainda, que a loja deve investir em uma maior regionalização dos produtos pelo país – podendo até mesmo, num futuro próximo, dar início a uma produção local.
A possibilidade é vista de outra forma por Tomanini. “A companhia pode começar a fabricar xales e sapatos no país e descobrir que compensa vender para o mundo a partir do Brasil”, comenta.
Seja lá por qual caminho seguir, a operação brasileira já conseguiu um feito e tanto em três anos: ser a terceira do mundo em número de lojas, depois dos Estados Unidos e do Canadá.
E, embora seja discreta sobre seus próximos passos (procurada para esta reportagem, a varejista não quis se manifestar), tudo indica que outros estão por vir em breve.
“A Forever 21 tem segurado o ritmo muito bem e o melhor momento para marcar território é agora”, completa Martins.
Fonte: Exame