Franqueadores e franqueados podem e devem se beneficiar de novas formas de fazer negócio e se relacionar, seja entre si, seja com os consumidores e fornecedores
Por Adir Ribeiro
Essa era de grandes transformações no mundo e no varejo será lembrada por nós, em um futuro próximo, como uma das mais marcantes. A nossa capacidade de adaptação e inovação foi fortemente impactada e nos mostrou que temos habilidades e competências que sequer imaginávamos possuir.
Diante desse cenário, abordo questões que acredito terem muito impacto (ou que ainda terão) nas operações que usam o modelo de franquias para a expansão dos seus negócios. São caminhos que podem contribuir para o nosso avanço como empreendedores, gestores, executivos e como seres humanos, mais conectados e empáticos.
1. Modelo de negócios
Antes mesmo da pandemia, os consumidores já vinham demonstrando mudanças no comportamento de compra, integrando cada vez mais o digital na jornada de consumo e colocando em xeque as operações físicas de muitos negócios. Acompanhar essa evolução, dentro do conceito do “customer centricity” (foco no consumidor), é fundamental para as franqueadoras atualizarem de forma estruturada seus modelos de negócios, envolvendo cada vez mais os franqueados (em geral, com suas operações físicas), revendo o “business plan” e refazendo as contas do que chamo de divisão dos 100% (valor total de venda de um produto ou serviço). Ou seja, existe uma nova lógica de criação de valor e exposição das marcas que demanda novos critérios para a formatação e simulação financeira, de modo a tornar o negócio financeiramente viável para todos (franqueadora, franqueados e clientes).
2. Integração digital
As empresas precisam integrar digitalmente seus processos operacionais para promover uma comunicação efetiva com o mercado, na geração de leads (para vendas de franquias ou mesmo dos seus produtos e serviços), na gestão dos negócios através de métricas e KPIs (indicadores chave de performance) e uso simplificado e amigável de dashboards (painel de controle) para rápida interpretação e tomada de decisão dos gestores. Também é necessário a busca de um investimento estratégico em tecnologia (assunto de conselhos de administração e alta direção das empresas) que facilite a jornada do cliente e também traga a segurança nos dados e proteções de seus sistemas de segurança (contra invasões, etc.).
Essa cultura digital precisa ser vertical e contar com o “patrocínio” da alta administração, que, na grande maioria das redes brasileiras, mantém nesses postos pessoas imigrantes digitais e não nativos digitais. A mudança de cultura é um processo necessário e, de certa forma, doloroso, mas necessário e vital para a transformação da rede como um todo.
3. Lifelong Learning
Conceito de aprendizagem para a vida toda, cada vez mais forte num mundo que muda rapidamente e exige novas respostas aos desafios, bem como referências para a tomada de decisão. Abrir-se ao constante aprendizado, revisitar crenças e convicções que funcionaram em outro contexto e trouxeram certo sucesso é um desafio fundamental para as lideranças das empresas.
É preciso revisitar a arquitetura de aprendizagem de todos os envolvidos em uma rede de franquias, das equipes das franqueadoras e de toda a rede de franqueados, cada vez mais impactados com formas de acesso às informações de maneira mais dinâmica e ágil. Programas de capacitação “chatos”, desatualizados e que não agregam valor não serão mais tolerados pelas pessoas, em um tempo veloz que demanda o consumo de informação relevante e objetiva.
É preciso desenvolver, para além das habilidades “hard” (técnicas), as “soft” (ou, como Simon Sinek definiu, as “Human Skills” – habilidades humanas), que tratam da forma como nos relacionamos com os outros e com nós mesmos e desenvolvemos empatia, inteligência emocional, entre outras habilidades.
A franqueadora de excelência saberá “ensinar seus franqueados e equipes” a pensarem corretamente para que engajem em seus princípios e crenças, além de manter uma cultura de liberdade com responsabilidade, que promova mais agilidade e envolvimento entre todos os membros de uma rede. Menos controle e mais contexto como forma de inspirar a todos nas suas condutas (uma inspiração é a Netflix, como aponta o livro “A Regra é não ter Regras”).
4. Franqueado de alta performance
sempre me perguntam sobre o perfil ideal do franqueado e confesso que há muito tempo desisti de encontrar essa resposta. Ao longo da minha experiência e convívio com muitos franqueados de sucesso não consegui identificar um comportamento padrão ou uma formação acadêmica específica. Porém, perguntamos para vários franqueadores, na pesquisa de benchmark da Praxis Business, quais são os maiores desafios na gestão das suas redes, e há cinco anos o tema que aparece em primeiro lugar é o perfil do franqueado.
Entendemos que as franqueadoras devem se responsabilizar mais e se envolver nesse processo de transformação desses empreendedores, capacitando, desenvolvendo e desafiando-os na busca por melhores resultados, liderando essa jornada de maneira exemplar e inspiracional, buscando desenvolver competências e habilidades de acordo com cada indivíduo e mantendo, em seus times de suporte, pessoas preparadas para ajudar a desenvolver os franqueados e equipes, numa jornada contínua.
É fundamental usarmos ferramentas de “assessment” (avaliação) baseadas em competências e dominância de comportamentos que sirvam de referência para o relacionamento com esses franqueados, de maneira mais efetiva e trazendo uma percepção de valor para a rede como um todo. Definitivamente os franqueadores devem evitar atribuir o insucesso de uma unidade somente ao perfil de um franqueado – não basta que ele tenha o perfil adequado, é preciso o envolvimento do franqueador. A ordem é fugir da “zona de conforto” presente em várias culturas de franqueadoras.
5. Excelência em Gestão da Rede
Diante de todas as transformações e impactos nos modelos financeiros, seja por inflação, tributação, logística ou outros motivos, as margens ficarão cada vez mais apertadas num ambiente mais competitivo. Logo, as franqueadoras deverão desenvolver na gestão de suas redes o que chamamos de EGR – Excelência em Gestão da Rede, envolvendo um novo modelo de suporte e segmentado, de acordo com as necessidades dos franqueados em seus clusteres.
Um programa de excelência deve ser implantado para premiar comportamentos e resultados positivos e incentivar a mudança de comportamento, trazendo de fato a meritocracia para a cultura da rede. E, não menos importante, medir, no mínimo anualmente, três indicadores, por meio de pesquisa com toda a rede de franqueados: 1) Nível de Engajamento dos Franqueados (na Praxis Business, medimos o IEF – Índice de Engajamento de franqueados); 2) Nível de Satisfação (ISF – satisfação); e 3) NPS (net promoter score) da franqueadora como um todo e de cada área que ela possui.
Um suporte efetivo e que gera valor de fato se dá por meio do atendimento correto das necessidades de cada grupo de franqueados e com equipes de suporte altamente treinadas e preparadas, para oferecer interações (sim, mais do que visitas) remotas ou presenciais, de acordo com o modelo de negócios, cultura da franqueadora, complexidade das operações e, principalmente, capacidade financeira da rede. Nesse novo contexto, as interações precisam gerar valor para todos os envolvidos – que sejam produtivas e, de fato, tragam melhoria para os resultados da rede.
6. Governança corporativa e fusões & aquisições
Cada vez mais, as empresas franqueadoras vêm atingindo patamares de performance suficientes para uma abertura de capital (IPO) ou mesmo fusão e aquisições, formando holdings de franqueadoras com maior geração de valor para todos os envolvidos, fortemente representados por conselhos de administração para as franqueadoras.
Trata-se de um desafio novo, de cultura de gestão e governança corporativa, que vai ajudar a perenizar os negócios e alcançar novos e melhores resultados, seja por meio da sinergia de negócios ou da conquista de novas oportunidades de mercado. Esse tema vem se tornando uma pauta imprescindível na agenda de quase todos os CEOs e diretores de franqueadoras que pretendem valorizar cada vez mais seus negócios, vendê-los ou se associar e compartilhar “equity” em seus negócios, ampliando o poder de desenvolvimento e agilidade para crescimento ou entrada em novos mercados, ou até mesmo para enfrentar novos concorrentes, muitas vezes em modelos de startups.
7. High tech, high touch & high teach (alta tecnologia, toque e ensino)
Essa tem sido a nossa melhor definição da franqueadora do futuro ou de excelência, entendendo que o tech (tecnologia) deve abordar todos os processos de negócios e atendimento/relacionamento com clientes e franqueados. Também deve buscar sempre o touch (toque humano) ou o “care” (cuidado) nas relações individuais e empreendedoras, para que a cultura prevaleça e para que haja um equilíbrio saudável nas relações complexas de franqueadores e franqueados. Tudo isso sem abandonar o teach (ensinar), ou seja, cada oportunidade de interação pode ser um aprendizado, uma reflexão, uma troca de informações e conhecimentos, uma evolução no pensar, entender mais os motivos reais, para assim desenvolver todos os integrantes do sistema de franquias, sejam franqueadores, franqueados, suas equipes ou os fornecedores (parte também integrante e fundamental).
Há muita evolução possível, capaz de melhorar ainda mais o sistema de franchising. Não se trata de clonar um conceito de negócio bem-sucedido, mas de gerar prosperidade para todos os envolvidos. Essa deve ser a razão principal e a referência para as nossas buscas e desejo de evolução constante e bem estruturada.
Por PEGN