06/11/2015 20:00
// Por: Luís Artur Nogueira
A definição do que é um produto barato ou caro tem uma enorme dose de subjetividade. A decisão de comprá-lo ou não, também. Tudo depende da renda do consumidor, pois, em tese, a percepção de um milionário sobre os preços tende a ser diferente da percepção de quem ganha um salário mínimo. A urgência na aquisição do item também pode justificar o pagamento de um preço maior. A escassez do produto, idem. Quanto vale uma garrafinha de água no deserto? Outro fator que deve ser considerado é a utilidade que o bem terá na vida do consumidor ou, simplesmente, a satisfação que ele lhe proporcionará. Na segunda-feira 2, em Nova York, o empresário Abilio Diniz afirmou, sem rodeios, que o Brasil está em liquidação, com ativos muito baratos para investidores estrangeiros. Abilio está correto, mas…
Com um currículo que dispensa apresentações, o ex-dono do Grupo Pão de Açúcar e atual presidente do conselho de administração da BRF possui um tino aguçado para negócios. A sua declaração, em evento da BRF, nos Estados Unidos, foi dada no momento em que ele comentava o atual patamar do dólar. Especular sobre o câmbio não é bom, mas os fundamentos da economia não permitem o dólar a R$ 4,00, um pouco mais ou um pouco menos, mesmo com a inflação próxima de 10%, afirmou.
De fato, a desvalorização do real de quase 50% neste ano transcende o cenário econômico nacional e internacional. Não se trata de ignorar os problemas fiscais do País nem o impacto que a provável alta dos juros pelo Banco Central dos Estados Unidos terá nas moedas do mundo inteiro. Mas, no caso brasileiro, é a crise política que explica a disparada do dólar. Até o apelido risco Dilma foi criado pelo mercado financeiro como forma de explicar as variações bruscas registradas no câmbio.
Com o dólar caro lembre-se, é um termo subjetivo , o estrangeiro fica mais rico quando troca a sua moeda por reais. Nesse contexto, Abilio está correto. É uma questão meramente matemática. Em dólar, as empresas brasileiras estão mais baratas. Mas e o valor em reais? Em alguns casos, também. A crise econômica, a desvalorização cambial e a alta dos juros trouxeram à tona um quadro financeiro difícil para muitas companhias nacionais. Neste momento, exibir um endividamento elevado é sinal de perigo ou até mesmo de fraqueza.
Não é à toa que grandes conglomerados como a Hypermarcas e a Alpargatas venderam, na semana passada, alguns ativos. O mesmo caminho é percorrido pelas gigantes Vale e Petrobras. Nessas horas, torna-se útil o velho ditado vão-se os anéis e ficam os dedos. Curiosamente, no dia seguinte à declaração de Abilio, a Bolsa de Valores de São Paulo registrou ganhos de 4,76%, a maior alta diária em 12 meses. Foi um movimento de compra de ações protagonizado por investidores estrangeiros, que provavelmente identificaram algumas pechinchas.
Porém, tanto no mercado financeiro como no mundo real, a decisão de compra de ativos não fica circunscrita à percepção de que algo está barato. No caso do Brasil, que permanece mergulhado em uma crise no pior estilo rosca sem fim, há outro componente importante que se assemelha a uma crença religiosa: a compra faz sentido, sim, se eu confiar na recuperação da economia, ainda que somente após outubro de 2018. Em última análise, quem está comprando agora acredita que o Brasil é maior do que qualquer governo. Pelo visto, Abilio Diniz acredita nisso. Eu também. E você?
Revista IstoÉ Dinheiro – SP