03/09/2015 às 05h00
Por Lisa Du | The Wall Street Journal, de Tóquio
No Japão, os trabalhadores de outros países estão assumindo um papel maior na economia, à medida que a falta de mão de obra impele o país a superar a sua longa resistência à participação de estrangeiros no mercado de trabalho.
Com centenas de milhares de postos de trabalho vagos, empresas que vão de restaurantes a fabricantes de autopeças fazem pressão para obter ajuda. “As empresas japonesas precisam de trabalhadores e o número de japoneses com formação universitária continua diminuindo”, diz Toshihiro Menju, diretor-administrativo do Centro Japonês para Intercâmbio Internacional, que defende mais imigração como forma de combater a lenta expansão da economia. “Essa lacuna vai continuar crescendo.”
Muitos asiáticos chegam ao país como estudantes com permissão para trabalhar cerca de 30 horas por semana. Outros se qualificam como aprendizes técnicos em programas de estágio que têm como objetivo ensinar a eles habilidades que podem levar para seus países.
Esses programas têm sido criticados pelos EUA e organizações internacionais como uma forma de mão de obra barata que carece de um controle eficaz e de proteção. O Japão o descreve como um esforço filantrópico e afirma que vai intensificar sua fiscalização.
Ainda assim, outros estrangeiros trabalham sem vistos adequados.
No ano passado, havia em torno de 788 mil trabalhadores estrangeiros legais no Japão, o que representou um crescimento de 15% em relação a dois anos antes, para cerca de 1,4% da força de trabalho total legal do país, de acordo com o Ministério do Trabalho japonês.
Anh Mai Thi, de 28 anos, foi de Hanói para Tóquio no fim 2012, com o desejo de aprender japonês. No Vietnã, havia estudado economia e trabalhado numa empresa que buscava expandir a cobertura da internet em áreas rurais.
Agora, trabalha meio período em dois lugares - como caixa num supermercado e como recepcionista em uma loja - para arcar com as despesas, enquanto frequenta uma escola profissional à noite. “Você tem que ter um emprego de meio período para viver no Japão”, diz ela.
Economistas consideram o envelhecimento da população japonesa e a redução no número de habitantes como um dos maiores desafios do premiê Shinzo Abe para fazer o Japão voltar a crescer. A taxa de desemprego está no menor nível em décadas e muitos japoneses relutam em aceitar trabalhos manuais pelos salários oferecidos.
Há, porém, quem defenda que o Japão já tem trabalhadores estrangeiros demais. Alguns citam dificuldade de integração e receios de que os trabalhadores japoneses possam ser prejudicados com o influxo de estrangeiros que aceitam salários mais baixos.
Takaaki Mitsuhashi, analista econômico que escreveu livros contra a imigração, diz que o Japão está a caminho de aumentar a produtividade e os salários. “Se os trabalhadores vierem para atender à escassez de mão de obra, haverá menos necessidade de elevar a produtividade e o nosso crescimento econômico seria perdido.”
Jaenudin Jaen, de Bekasi, na Indonésia, sente a demanda crescente na empresa de autopeças em que trabalha. A fábrica, que conta com 120 trabalhadores, emprega pessoas do Brasil e das Filipinas, segundo ele.
“Todos os japoneses trabalham no escritório principal; na fábrica, estão principalmente os estrangeiros”, conta Jaen, de 24 anos, que chegou ao Japão há dois anos e meio para estagiar como técnico. Ele diz que normalmente trabalha 11 horas por dia. Em poucos meses, Jaen voltará para casa, pois atingirá o prazo limite do programa, que é de três anos.
Há muito o Japão vê a si próprio como um país etnicamente homogêneo, apesar da presença de algumas colônias de estrangeiros, como coreanos. A discussão sobre a possibilidade de ampliar o número de trabalhadores estrangeiros tende a elevar os temores de crimes e agitações sociais.
Imigração ainda é um assunto delicado no país. “Há vários problemas associados à imigração nos países europeus e nós temos que analisar essas questões”, disse Abe ao Parlamento em fevereiro.
Seus assessores apontam para mudanças modestas, como facilitar a obtenção de vistos por trabalhadores qualificados e permitir que os estagiários fiquem no país por dois anos a mais. Mas eles dizem que o governo provavelmente não vai abrir completamente as portas para os estrangeiros. Isso está frustrando alguns empresários, que afirmam que ainda é muito difícil contratar gente de fora.
Jin Hatano, diretor-presidente de uma empresa de marketing na internet, diz que 8 dos seus 50 funcionários em Tóquio são de outros países. A maioria são programadores e ele gostaria de contratar mais. Mas Hatano diz que o processo para obtenção de visto é rígido e complicado.
Shigeyoshi Kanda comanda uma firma que recruta pessoas para trabalhar em restaurantes, startups de tecnologia e outros tipos de empresas. Ele diz que a demanda por estrangeiros é alta, “mas não há [pessoas] o suficiente”.
O comportamento está mudando em algumas grandes empresas com ambição de se tornarem líderes globais. Neste ano, a Honda disse que até 2020 vai adotar o inglês como sua língua oficial. Companhias como a Hitachi estão incluindo não japoneses em seus conselhos de administração.
Pesquisa de 2014 feita pela firma de recrutamento Disco revelou que 36% das empresas consultadas já contrataram ou pretendem contratar estudantes estrangeiros no Japão. O percentual é o triplo do verificado quatro anos antes.
Valor Econômico – SP