Ideia é permitir horários móveis de trabalho, para ajustar as equipes às flutuações de consumidores
Segundo entidades, legislação atual foi criada para a indústria, e mudança beneficia jovens e aposentados
CLAUDIA ROLLI
DE SÃO PAULO
Um grupo de 15 entidades de varejo e serviços (incluindo bares, restaurantes e franquias) discute com o governo a criação de uma jornada móvel. A ideia é criar uma cota “flex”, em que os horários de trabalho atenderiam à flutuação de clientes.
Aposentados, trabalhadores da terceira idade, jovens e estudantes poderiam trabalhar, por exemplo, de quinta-feira a domingo, ou apenas duas vezes por semana, conforme suas possibilidades e e segundo a demanda do estabelecimento ou loja.
Para os empresários desses segmentos, as regras trabalhistas atualmente em vigor atendem uma economia voltada para o setor industrial desde a criação da CLT, na década de 40, e precisam ser modernizadas.
A legislação prevê jornada de 44 horas semanais com oito horas diárias e limite de duas extras por dia. Pode ser alterada se houver acordo coletivo negociado com sindicatos. A lei que regulamentou a profissão do comerciário, de 2013, permite jornada de seis horas diárias em turnos de revezamento.
“Com a jornada atual, o varejo tem quadro de funcionários maior do que precisa em alguns momentos e menor do que o necessário em outros”, diz o consultor Eduardo Terra, que preside a SBVC (Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo), entidade com executivos, empresários e especialistas do setor.
As conversas com o governo começaram em maio, mas se intensificaram num momento em que a queda da atividade econômica começa a afetar também o varejo e o serviço, antes ainda resistentes ao aumento de demissões.
Segundo Adriana Flosi, vice-presidente da Federação das Associações Comerciais de SP (Facesp), a mudança beneficiaria também os trabalhadores de várias idades.
Ao menos 1 milhão de jovens abandonam o estudo por ano, segundo o MEC, porque não conseguem ir à escola e trabalhar ou porque não têm renda (trabalho) para manter os estudos, cita ela.
“Um aposentado pode não ter energia para trabalhar oito horas por dia, mas ter para duas. E um jovem pode querer trabalhar só aos finais de semana”, diz a executiva.
“Ninguém quer retirar direitos do trabalhador. A ideia é permitir formas menos engessadas de contratação.”
Para compensar a jornada menor, uma das ideias pode ser valorizar a hora trabalhada dos que atuarem no esquema móvel de contratação.
ONDE EXISTE
Na loja de lingerie da Victoria’s Secret, em NY, parte das funcionárias trabalha de forma flex. No cadastro da rede constam 200 vendedoras que são acionadas segundo sua disponibilidade para trabalhar, já informada à empresa previamente, cita o consultor e presidente da SBVC.
O grupo de supermercados Walmart também contrata, nos EUA, pessoas acima de 55 anos como repositores de prateleira nos horários “barriga”, de menos clientes. “São grupos com jornadas móveis e muitos trabalham para complementar a renda”, diz Ivo Dall’Acqua Junior, vice-presidente da FecomercioSP.
O setor de bares e restaurantes, com 6 milhões de empregados com e sem carteira, estima que a geração de 2 milhões de vagas com a adoção da jornada móvel. Paulo Solmucci Júnior, presidente da Abrasel, associação do setor, diz que o cálculo considera que 45% das vagas com jornada de 25 horas semanais.
Em momentos de instabilidade econômica, medidas como a da jornada móvel ou flexível, termo quase não usado pelo setor por causa da resistência dos sindicatos também pode evitar demissões e manter os empregos, avalia Dall’Acqua Junior.
O varejo representa 22% do PIB e emprega 20% dos trabalhadores do Brasil.
Folha de S. Paulo – SP