11/06/2015 às 05h00 Por Eduardo Laguna | De São Paulo Notícias recentes sobre a investida da Fiat Chrysler Automobiles (FCA) em direção a uma fusão com a americana General Motors (GM) levantaram a possibilidade do surgimento de uma líder gigante da indústria automobilística mundial, com fortes implicações na configuração e nas relações de força do mercado brasileiro. Unidas, Fiat e GM respectivamente, a primeira e a segunda marca do mercado nacional teriam 38% das vendas de carros no Brasil, com três dos cinco modelos mais vendidos (Palio, Onix e Uno) e produção conjunta de 1,26 milhão de veículos ou 40% do volume de carros de passeio e utilitários leves montados no país em 2014. Em escala global, a fusão entre a terceira (GM) e a sétima (FCA) maior fabricante de automóveis do mundo criaria um grupo com vendas anuais próximas de 15 milhões de veículos e faturamento conjunto de US$ 272,6 bilhões, suplantando a hoje líder Toyota, dona de uma receita anual de US$ 227 bilhões e vendas de, em 2014, 10,2 milhões de carros. Os benefícios mais visíveis e também imediatos da aliança viriam dessa nova escala, dizem analistas. Ganhase inteligência com a soma de conhecimentos no desenvolvimento de produtos, bem como, na área de compras, maior poder para barganhar até mesmo com os gigantes do setor de tecnologia no momento em que as montadoras entram na era da conectividade. Ao mesmo tempo, ao compartilhar plataformas e integrar equipes, Fiat e GM conseguiriam cortar custos para enfrentar com rentabilidade os ciclos recessivos do mercado. O tamanho da nova empresa, porém, causa dúvidas se a operação conseguiria passar por órgãos antitruste sem restrições e contestações por concorrentes. Para José Del Chiaro, advogado especialista em Direito Concorrencial, um dos riscos no Brasil seria o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) cobrar a aposentadoria ou licenciamento a terceiros de produtos em faixas de mercado onde as marcas têm maior concentração, em especial nas linhas mais populares. “Não consigo imaginar a aprovação desse negócio sem desinvestimentos. Pode haver tantas restrições que a fusão poderia deixar de ser interessante”, afirma Del Chiaro, primeiro Secretário de Direito Econômico (SDE) do governo federal e que hoje tem a Volkswagen em sua carteira de clientes. Para alguns analistas, o choque cultural também pode ser um óbice na integração das empresas, inseridas numa industria em que não faltam exemplos de fusões malsucedidas, como a frustrada união da alemã Daimler com a americana Chrysler entre 1998 e 2007. No início da década passada, Fiat e GM tiveram uma experiência amarga quando constituíram uma joint venture para compartilhar custos e tecnologia de motores. Cinco anos depois do anúncio e em meio a uma grave crise financeira da Fiat, a GM teve de desembolsar US$ 1,99 bilhão para deixar o negócio em 2005. Sergio Marchionne, o italiano que comanda a FCA, está à frente da nova incursão da montadora ítaloamericana. Após ter sua proposta de fusão rejeitada pela direção da GM, ele tem buscado o apoio de investidores a seu projeto de consolidação, conforme noticiou o “The Wall Street Journal”. Em resposta, a chefe global da GM, Mary Barra, argumentou nesta semana que a união das montadoras não produziria grandes efeitos em termos de escala e interromperia os esforços do grupo em melhorar suas próprias operações. Letícia Costa, especialista do Insper no setor, avalia que a fusão traria ganhos imediatos em compras conjuntas, uma área onde há menor conflito de culturas. Já a unificação de plataformas, que exigiria investimentos pesados e uma decisão sobre qual base tecnológica seguir, poderia ser foco de maior resistência interna. Para ela, a Fiat, que tem forte presença nos segmentos mais populares de carros compactos, se beneficiaria no Brasil por uma oferta mais ampla permitida pelo portfólio da GM. Já o consultor Luiz Carlos Mello, do Centro de Estudos Automotivos (CEA), afirma que as duas empresas teriam “vantagem extraordinária” no país com a união das forças de compra e redes de revendas.
Valor Econômico – SP