26/03/2015 às 05h00
Por Fernando Torres | De São Paulo
A compra da Kraft pela Heinz eleva para a impressionante cifra de US$ 260 bilhões o valor de mercado das empresas sob gestão direta ou indireta dos três principais sócios da 3G: Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira. Juntas, AB Inbev, Kraft Heinz, Lojas Americanas e Restaurant Brands (que reúne as redes Burger King e Tim Hortons) tiveram receita líquida de US$ 87 bilhões em 2014 e o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) de US$ 37 bilhões, o que resulta numa margem média acima de 40%. A promessa feita ontem foi de elevar em mais US$ 1,5 bilhão o Ebitda “do grupo” até 2017, apenas por meio da implantação de cortes de custos e despesas na nova empresa que se formou, que passaria a ter uma geração potencial de caixa anual próxima de US$ 8 bilhões, ante os US$ 6,5 bilhões registrados em 2014. Durante a teleconferência de ontem com investidores e analistas, alguns mostraram dúvidas sobre a real capacidade de a empresa entregar esse número, por considerarem que a Kraft já possui uma estrutura enxuta. Já outros interlocutores questionaram se a empresa estava sendo conservadora demais na expectativa, diante do histórico da 3G de entregar resultados que superam as estimativas. Dados levantados pelo Valor com base nos balanços das empresas reforçam a segunda opção. Antes de ser comprada pela então Inbev, a fabricante de cervejas americana AnheuserBusch, dona da marca Budweiser, tinha margem Ebitda próxima de 23%. Com a entrada da nova gestão, esse índice subiu para 42%. No Burger King, um ano depois do anúncio da aquisição, os custos e despesas já mostravam queda da ordem de 30%, tendo como explicação principal a implantação do sistema de orçamento base zero, pelo qual em cada ano os gastos precisam ser justificados, sem usar o dispêndio do exercício anterior como referência inicial. No caso da rede de lanchonetes, que comprou a cadeia de cafeterias canadense Tim Hortons no fim do ano passado, o saldo da margem Ebitda de 18% para 69% também se explica para revisão do modelo de negócios, concentrado principalmente no uso de franquias, e não de lojas próprias, que reduziu a receita líquida contabilizada no período, diminuindo o denominador dessa relação. Mas o Ebitda nominal apenas do Burger King saltou 60% entre 2010 e 2014, para US$ 726 milhões, em uma época em que a mudança de hábitos dos consumidores não favoreceu as redes de fast food. Na penúltima aquisição relevante do grupo, da fabricante de ketchup e outros alimentos Heinz, o receituário foi o mesmo. Já no primeiro ano em que a nova gestão assumiu, a margem Ebitda subiu de 17% para 26%. O resultado fez o sócio Warren Buffett destacar, no relatório anual da Berkshire Hathaway, que a empresa está muito melhor gerida sob o comando de Alex Behring e Bernardo Hees do que estaria sob seus cuidados. Com a fusão entre Heinz e Kraft, existe a expectativa de que a economia de custos pode ser facilitada, já que ela não virá apenas do novo modelo de gestão do orçamento, mas também de sinergias pela eliminação de estruturas administrativas duplicadas. Outra expectativa presente no mercado é a de que as compras do 3G não parem por aí. Analistas do Nomura disseram que o trio deve seguir na tentativa de criar uma Nestlé dos EUA, enquanto relatório da casa de análise Bernstein citou a área de mercearia da Mondelez, que nasceu de uma cisão da Kraft, como o alvo mais provável. (Colaborou Thais Carrança)
Valor Econômico – SP