24/03/2015 às 05h00
Por Adriana Mattos | De São Paulo
O grupo chileno Cencosud está liquidando quase a totalidade da dívida da companhia no Brasil, transferindo US$ 350 milhões para a operação valor que corresponde a pouco mais de um terço do US$ 1 bilhão captados pela varejista em emissão de bônus no mercado internacional, como anunciado em fevereiro. A transação para liquidação dos débitos no país deve ser concluída no primeiro semestre, como antecipou ontem o Valor PRO, serviço de informações em tempo real do Valor. Desta forma, a dívida da filial se transformará num débito entre matriz e subsidiária (“intercompany”), com redução no custo financeiro para a operação brasileira. O grupo, dono das redes GBarbosa, Bretas, Prezunic, Perini e Mercantil Rodrigues, é o quarto maior supermercadista do país. Meses atrás, surgiram informações no mercado de que a empresa poderia vender ativos no Brasil para reduzir a dívida local. A companhia nega que vá se desfazer de redes no país (eram 220 lojas em setembro de 2014), assim como nega que a captação de recursos pressione mais o nível de alavancagem do Cencosud, que subiu em 2014. Nos últimos anos, com a expansão dos negócios no país e a aquisição de concorrentes (que somou cerca de R$ 3 bilhões entre 2007 e 2011, calcula o Valor), o patamar de endividamento aumentou, sem resposta da receita operacional, que cresce abaixo da inflação. A empresa não informa relação entre dívida líquida e lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação (Ebitda, na sigla em inglês) no Brasil. No grupo, em setembro de 2014, a relação entre dívida líquida e Ebitda ajustado estava em 3,77 vezes, versus 3,4 vezes no fim de 2013. Em setembro de 2014, o grupo informou em balanço dívida líquida de cerca de 2,81 trilhões de pesos chilenos (R$ 11,5 bilhões, considerando a cotação em setembro), versus 2,45 trilhões de pesos ao fim de 2013 (R$ 11 bilhões, na cotação de dezembro de 2013). “A emissão tem condições mais vantajosas do que aquelas negociadas com bancos no Brasil e isso já reduz custos. Além disso, ainda fechamos a operação de parceria com o Scotiabank [no ano passado, o banco passou a ter 51% do negócio de cartões de crédito da Cencosud], com a entrada desses recursos no caixa [do grupo]. Temos uma situação mais confortável”, disse Sebastian Los, diretor financeiro da Cencosud Brasil. O acordo anunciado com o Scotiabank no segundo semestre de 2014 envolvia cerca de US$ 1,3 bilhão pelo braço financeiro da Cencosud. A emissão de bônus informada em fevereiro envolveu US$ 650 milhões com vencimento em 10 anos, e outros US$ 350 milhões em 30 anos. O custo da operação foi baseado nos juros do título da dívida do Tesouro americano, mais um spread de 3,375 % para o prazo de 10 anos, e de 4,2% para 30 anos. Cerca de 150 investidores participaram da operação, que inicialmente envolvia a captação de US$ 400 milhões, mas por causa da demanda, atingiu US$ 1 bilhão. A captação foi liderada pelos bancos HSBC e Scotiabank. A empresa não informa as condições da dívida liquidada no Brasil, mas tem como base a taxa básica (Selic), somado ao spread. Entre 5% a 10% da dívida da rede no país não foi paga porque a empresa entendeu que se tratam de emissões a custo baixo. Pelo perfil da dívida, metade era de vencimento a longo prazo e a outra metade a curto prazo. Há oito anos no país, a companhia ainda tem dificuldades para crescer acima do mercado. No terceiro trimestre de 2014 (último dado disponível), as vendas somaram R$ 2,15 bilhões no Brasil, alta de 1,4%. É o país com a menor taxa de expansão entre as regiões onde o grupo está presente (Chile, Peru, Colômbia e Argentina). Isso fez crescer rumores de que a operação pudesse ser vendida. Mesmo que opte por esse caminho, o que a rede descarta, a questão está em como recuperar um investimento feito quando os preços das lojas estava em alta e, especialmente, como achar interessados. O mercado considera ativos com maior potencial de expansão as redes Bretas (MG) e Prezunic (RJ). A empresa tem mencionado o desaquecimento no consumo para explicar o desempenho no país, mas analistas entendem que aquisições de algumas redes com fracos resultados afetam os números. Mudanças no modelo de gestão, nos cargos de chefia e descentralização na tomada de decisões foram ações tomadas para reverter resultados. “O único projeto que existe em discussão é o ‘spinoff’ da operação de real estate do grupo, e também não é nada formal ainda”, disse o executivo. Em janeiro, a Cencosud admitiu que considera a hipótese de separar a sua operação de shopping centers e bens imobiliários e fazer uma oferta pública inicial de ações desse braço na bolsa de Santiago, podendo, portanto, transferir dívida na área imobiliária para esta empresa. “Não há decisão a respeito [do spinoff], ainda estamos na fase de debater [o assunto]”, disse.
Valor Econômico – SP