Na última década, a competição entre varejistas brasileiros pela preferência do consumidor final tornou-se mais acirrada devido à quantidade de opções disponíveis aos clientes, e, sobretudo, às mudanças no perfil e nos hábitos de consumo no País. Isso aconteceu devido à introdução de novas tecnologias da informação e ao aumento no poder de compra. Agora, munidos de uma quantidade de informações inimaginável há alguns anos, passaram a pesquisar mais antes de fechar negócio, e também começaram a questionar seus fornecedores. Neste cenário, destaca-se quem está mais preparado para oferecer experiências personalizadas aos clientes, sanando eventuais dúvidas e oferecendo produtos e serviços mais aderentes às necessidades deste consumidor.
Por conta disto, parte dos varejistas, sobretudo redes de grande e médio portes, já adotam iniciativas de mapeamento de informações sobre quem visita suas lojas físicas ou virtuais, com o chamado Big Data. E os dados e estatísticas coletados pelo comerciante têm ajudado a impactar positivamente os resultados de diversas redes, que agora sabem o que seus clientes esperam delas quando vão a um ponto de vendas ou simplesmente param para olhar um produto na vitrine.
Nesta edição, a Revista Varejo & Oportunidades traz uma entrevista com o diretor de soluções para a América Latina da dunnhumby, José Luiz Gomes. A empresa para a qual ele trabalha desenvolve projetos de Big Data para diversos grandes varejistas no Brasil e em outros países. Nesta entrevista, ele fala sobre as principais tendências neste setor e comenta, por exemplo, sobre a importância da adoção de tecnologias de monitoramento para aumentar a produtividade das empresas de varejo, e como isso pode ser adotado por lojas de menor porte também.
A tecnologia torna o varejista mais competitivo?
Não apenas a tecnologia. Acredito que ele se torna mais competitivo quando passa a entender o que os clientes querem. Quem compreende melhor as necessidades do consumidor e entrega uma proposta de valor para eles, acaba ganhando. A base do sucesso é, na verdade, uma mistura de várias coisas, e também da tecnologia para conhecer melhor seu cliente.
O que as empresas precisam fazer para entender seu cliente?
Antes de se adotar a tecnologia e o Big Data, as empresas precisam saber o que têm dentro de casa, quais ferramentas usam para coletar informações sobre os consumidores e quais as possibilidades de se fazer outra coisa. A empresa deve se questionar se quer, de fato, desenvolver um projeto que traga retorno e que seja realmente interessante, ou se quer apenas gerar uma experimentação. Neste caso, não recomendo à empresa um investimento em tecnologia cara sem saber se terá capacidade usar esse dado. Um dos pontos mais fortes do trabalho da dunnhumby é transformar os dados em ação, e esta ação tem que justificar o investimento inicial.
É possível para um pequeno varejista usar tecnologia e Big Data no seu negócio?
Acho que sim. Precisamos desmistificar o termo Big Data. Alguns especialistas dirão que um varejista pequeno não pode usar porque é pequeno. Mas, para nós, eles devem usar os dados que têm disponíveis, pois conhecer os clientes é fundamental e ajuda o varejista a fazer uma abordagem mais focada e a melhorar a experiência de quem vai à loja. Agora, se eles terão dimensão para depois fazer uso dessas informações para conseguir um retorno maior, é outra discussão, e, dependendo do objetivo, será preciso ter uma escala mínima para conseguir fazer. Eu diria também que, quando os custos baixarem, o uso de informações e da tecnologia tende a democratizar. É uma questão de tempo até o menor varejista conseguir ter alguns dados para melhorar o desempenho de seu negócio.
Para onde caminha a tecnologia no varejo?
O que temos visto e feito são experiências no campo da mobilidade na busca por melhorar a experiência do cliente na loja. Temos agora tecnologia que permite saber até o metro, o raio de ação de uma pessoa dentro do ponto de vendas, e sem precisar de wi-fi ou bluetooth, nem de grande infraestrutura nas lojas. Nessa área, temos feito algumas experiências nos Estados Unidos e na Inglaterra, que têm sido muito úteis. E temos uma parte de inovação fortíssima na Coréia do Sul, onde testamos muitas coisas. Acho que o foco tem que ser principalmente na melhoria da experiência de compra e na parte de plataforma online de e-commerce, nas quais a gente vê uma oportunidade muito grande.
Como estão essas áreas no Brasil?
No Brasil, essas áreas são pouco desenvolvidas. Os próprios sites ainda não têm todas as funcionalidades que a gente vê lá fora. E novamente temos a questão de entender qual a experiência que você está tentando entregar para o consumidor, e qual é o problema que se está tentando resolver para ele. Se pegar tecnologia só por pegar, não dá certo, não funciona. O exemplo que a gente usa sempre é o Táxi 99. Hoje temos taxistas com 70 anos e todos com aplicativo. E há um ou dois anos ninguém tinha. Então, ele foi útil, resolveu um problema que o passageiro e o taxista tinham. Esse é o caminho para adoção de tecnologia no varejo.
O varejista brasileiro já se acostumou a usar tecnologia?
Vemos que tem muita inovação por aqui, e o desejo de ser inovador. Nossos clientes, os maiores varejistas do País, são claramente acima da média. Algumas empresas brasileiras têm feito coisas interessantes, entre elas o Magazine Luiza e o próprio Grupo Pão de Açúcar. E, além dos grandes varejistas, temos observado players menores fazendo coisas interessantes também. Percebemos que as empresas querem saber mais sobre inovações e tecnologias. Veja que na NRF (National Retail Federation), hoje, a maior delegação do mundo é do Brasil. E a NRF é cada vez menos uma convenção de varejo e mais de tecnologia.
A adoção acompanha o resto do mundo?
Acho que não, mas por motivos bem simples: a expansão de novos canais de conveniência, como o atacarejo, e de novos formatos têm sido tão bem-sucedido que não vemos tantas apostas em outras áreas. E também tem outro ponto, que é a adoção pelo brasileiro da informatização e da mobilidade. Nos Estados Unidos, Europa e Coréia do Sul, eles estão claramente mais avançados neste ponto. Mas isso é uma questão que em dois ou três anos não vai mais existir, e aí vai haver uma maior proliferação de tecnologias nas lojas brasileiras. Mas, neste momento, ter empresas com dimensão para fazer esses investimentos é extremamente importante.
O que é necessário para não errar na hora de escolher parceiro e tecnologia?
Em primeiro lugar, que saiba o que está tentando resolver em termos de experiência do cliente. Se você está apenas testando a tecnologia, a chance de dar certo é especialmente baixa. Então, a gente fala em três regras: é preciso ser relevante para o cliente, ser fácil e ser imediato. Se conseguir essas três coisas, muda o panorama da empresa. E saiba sempre o que está tentando resolver para o cliente, e depois vá atrás da tecnologia que vai proporcionar essa experiência.
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