Por Isabel Gomes | Nas prateleiras de um supermercado em São Paulo, a cerca de 1.140 quilômetros de Porto Alegre, pacotes de erva de chimarrão, itens com estampa da dupla Grenal e um suco natural de “bergamota” são vistos. Parece até uma forma de se teletransportar ao Rio Grande do Sul, não fosse a expressão de estranheza do atendente da padaria ao pedido do cliente gaúcho por uma dúzia de “cacetinhos” (o pão francês, “em tradução livre”).
Para muitos gaúchos que decidiram fazer a vida em São Paulo, visitar um mercado Zaffari é como voltar para casa por alguns instantes. Diferentemente de outras marcas do varejo que optam por celebrar seu regionalismo dentro das fronteiras do Estado de origem, o Grupo Zaffari, profundamente enraizado na cultura do Rio Grande do Sul, ousou cruzar essas linhas geográficas. Em São Paulo, são duas operações de varejo que não deixam de lado sua cultura — e, consequentemente, seu público de origem.
O regionalismo é uma marca do varejo brasileiro. Quase a metade (46%) das 300 maiores empresas em faturamento do País — ou 139 companhias —, operam em apenas um Estado. Nesta série de reportagens, o Estadão apresenta as empresas que se destacam em suas regiões. São redes varejistas muito fortes localmente e que têm como um dos seus grandes ativos conhecer as preferências do consumidor. Muitas vendem até mais de R$ 1 bilhão por ano.
Fundado em 1935, o grupo Zaffari conta com 38 lojas de mercados e hipermercados no Rio Grande do Sul, concentradas especialmente na região da capital Porto Alegre. A marca é a maior rede de supermercados do Rio Grande do Sul e uma das maiores do País. Em 2022, a empresa faturou R$ 6,9 bilhões, ocupando a 11ª posição em faturamento do segmento de supermercados no Brasil, segundo o ranking da Associação Brasileira de Supermercados (Abras).
Considerando todo o varejo, o Zaffari desponta em 30º lugar entre as 300 maiores empresas brasileiras, segundo a Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC).
Atualmente, a rede conta com duas lojas na capital paulista: o Hipermercado Záffari, no Shopping Bourbon — que é a bandeira de shoppings centers da empresa —, no bairro Pompeia, aberto em 2008, e o Hipermercado Záffari no shopping Morumbi Town, inaugurado em 2016, na Vila Andrade. Em São Paulo, os mercados ganharam acento no nome — uma espécie de “licença poética” para enfatizar a pronuncia correta do nome aos paulistas, de acordo com a empresa.
A criação das lojas foi um passo adiante em uma relação que já existia anteriormente com fornecedores paulistas, por meio da entrega ao Sul de produtos de outras regiões do País. “Há muitos anos já possuíamos atividades em São Paulo, e chegar até a implantação de operações de varejo de alimentos foi uma questão de tempo e de oportunidade. Aprimoramos assim a logística e tornamos mais eficiente as relações que já existiam. E, em decorrência, ampliamos a presença da marca”, conta Claudio Luiz Zaffari, um dos diretores do Grupo Zaffari.
Um refúgio para os gaúchos
Com a criação das lojas, esse movimento virou uma via de mão dupla: se antes os sulistas recebiam pelo Zaffari produtos de outras culturas brasileiras vindas de São Paulo, os moradores da capital paulista passaram, então, a ter fácil acesso a produtos típicos da cultura gaúcha por meio dos hipermercados. A rede optou por seguir vendendo produtos típicos do Sul, como erva-mate para chimarrão, por exemplo, além de cuia, bomba, nata, cuca alemã e outros itens.
“Para nós e para os nossos consumidores, esses produtos fazem parte de hábitos culturais e de alimentação diária. Ao mesmo tempo, representam laços de identidade e tradição”, explicou Claudio Luiz. Naturalmente, os expatriados gaúchos em São Paulo, por sua vez, acabaram buscando a rede como um “refúgio” para matar a saudade de casa. “Sem dúvida, as visitas de gaúchos são frequentes e nos orgulham, gerando uma positiva e significativa relação”, conta o diretor.
Uma dessas visitas frequentes é da gaúcha Marianna Tondolo, estudante de artes cênicas que vive em São Paulo desde 2017. O hábito de ir ao Zaffari, que já era frequente no bairro Bom Fim, onde vivia com a família em Porto Alegre, foi replicado na capital paulista, ganhando uma pitada de “sentimento de casa”.
“Eu sempre frequentava (em Porto Alegre), inclusive o programa mais divertido do mundo para mim, desde criança, é ir no Zaffari com meu pai, principalmente em época de Natal (…). Então, é muito um sentimento de casa aqui em São Paulo, nesse sentido de que me lembra muitas as coisas da minha infância”, relata.
A estudante conta que sempre que possível tenta priorizar a rede para fazer as compras em São Paulo, especialmente por encontrar lá produtos como a cuca alemã, o suco Naturale (próprio do grupo Zaffari), erva de chimarrão, entre outros itens. “Tem várias marcas que são de lá que eu consigo ter contato aqui e para mim isso é muito valioso”, conta.
Negócios em expansão
O grupo, que opera com capital 100% brasileiro e conta com cerca de 12 mil funcionários em todo o País, atua, além dos supermercados, na administração de shopping centers e, mais recentemente, na operação da marca atacadista Cestto.
Em sua lista de operações, o grupo tem um extenso rol de projetos em execução ou na fila para serem iniciados, como a inauguração de um novo Bourbon Shopping em Porto Alegre, na Avenida Carlos Gomes, um mercado Zaffari no Moinhos Shopping, também na capital gaúcha, em 2025.
A marca atacadista Cestto, que foi lançada em 2022 e teve a primeira unidade inaugurada em abril deste ano, na cidade de Gravataí, também deve se expandir, incluindo São Paulo no roteiro de ampliação. Duas novas unidades abrirão em 2024 em Porto Alegre, uma na zona sul e outra na zona leste, previstas para primeiro e segundo semestre do ano, respectivamente.
Em São Paulo, a Cestto se alocará em Taboão da Serra, na zona sudoeste da região metropolitana da capital, ainda sem previsão de abertura. Com a novidade, os gaúchos em São Paulo ganham mais uma opção para comprar erva-mate.
Fonte: Estadão