Por Katia Simões | O primeiro acesso da coordenadora de marketing Adrielle Gerez à plataforma AliExpress foi em 2014, em busca de produtos ligados ao k-pop, a música pop coreana que se tornou febre entre os jovens. Naquela época, a navegação era menos amigável e a entrega demorava meses. Uma década depois, as compras no marketplace e em lojas virtuais como Shein e Shopee se tornaram mensais.
— A experiência melhorou muito, assim como a oferta de produtos alinhados com o meu perfil — conta Gerez. — Nunca tive problemas e chego a economizar até 50% na compra de roupa plus size a equipamentos eletrônicos — diz ela, que tem tíquete médio mensal de R$ 100.
Adrielle é uma entre milhares de consumidores brasileiros que aumentam o volume de transações on-line feitas a partir de marketplaces e varejistas chineses. Em 2022, segundo dados da Associação Brasileira de Varejo e Consumo, os brasileiros gastaram mais de R$ 50 bilhões em mercadorias internacionais, especialmente da China e do Vietnã, o equivalente a 20% do comércio eletrônico brasileiro. O percentual de usuários nacionais que compram em sites estrangeiros alcançou 72% em 2022, tendo como foco principal Shein, Shopee e AliExpress, segundo levantamento da NielsenIQ Ebit.
O interesse é recíproco. Com a expansão do comércio on-line, que responde por 11% das vendas do varejo nacional, o Brasil entrou no radar das gigantes.
— O país está entre os cinco maiores mercados da AliExpress e possui um grande potencial de expansão, pois está distante de Estados Unidos, Coreia do Sul e Reino Unido, onde 30% do varejo está no canal on-line, e da China, que tem 52% — afirma Briza Bueno, diretora da AliExpress.
Há 13 anos no Brasil, o serviço tem mais de 7 milhões de usuários diários no país, é líder em cross-border (compra e venda entre países) e tem 46,4% de share, considerando-se apenas acessos pela web, segundo dados da Similarweb e da Conversion. De acordo com Alberto Serrentino, fundador da Varese Retail, fomentar o cross-border globalmente é uma estratégia praticada pela China há muito tempo.
— Eles não só vendem da China para o mundo, como também compram muito do exterior por meio de duas grandes plataformas: AliExpress e Timol — afirma. — O Brasil, porém, não está aproveitando a oportunidade reversa que é usar as mesmas estruturas para vender para os chineses — aponta.
Há menos tempo no mercado brasileiro, mas com o mesmo apetite da AliExpress, a Shein, varejista global on-line de moda, beleza e lifestyle, conta com três centros de produção no mundo, um deles no Brasil. Em março de 2023, deu início à operação local, em parceria com 330 fábricas.
— O objetivo é ter 85% das vendas no Brasil composta por produtos produzidos no país até o final de 2026. Para tanto, assumimos o compromisso de estabelecer parceria com 2 mil fábricas — afirma a diretora de produção local da Shein Brasil, Fabiana Magalhães. — O Brasil está entre os cinco maiores mercados do mundo para a empresa – diz.
Competitividade
Presente em mais de 150 países, com 6 mil fornecedores globais e 250 milhões de seguidores nas redes sociais, a Shein trabalha com um modelo de negócio baseado em produção de pequena escala. Fabrica apenas de 100 a 200 unidades por produto e mede a resposta do mercado em tempo real, produzindo em maior escala somente o que tem demanda garantida.
— Não se trata de fenômeno local, que promove concorrência predatória no Brasil. A Shein cresce globalmente — diz Serrentino. — É a número 1 em busca de moda na Europa, EUA e Brasil.
À frente da trading China Gate, Rodrigo Giraldelli observa que o que apavora os varejistas brasileiros é a velocidade com que as empresas chinesas entram e ganham participação no mercado.
— Eles têm fórmula difícil de ser superada que une custo baixo, alta tecnologia e logística eficiente. É preciso ficar esperto, buscar eficiência, porque eles chegaram para ficar.
Estudo encomendado pelo Instituto para Desenvolvimento do Varejo em parceria com o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação revela que o atual sistema de tributação concede vantagens que podem chegar a 60% para as gigantes chinesas.
O programa Remessa Conforme, lançado em 2023, é uma tentativa de regularizar a arrecadação de impostos sobre produtos importados. Compras até US$ 50 continuam isentas e respondem pela maioria das transações feitas com as chinesas. O governo, contudo, sinaliza que novas regras devem entrar em vigor em 2024.
Fonte: O Globo