O varejo brasileiro se desenvolveu e vem amadurecendo em ciclos. Entre 2003 e 2012, houve o ciclo do boom de Consumo, no qual a escala do mercado cresceu, acompanhada por um salto no grau de amadurecimento. As empresas de varejo cresceram e expandiram seus negócios, buscando novos mercados, formatos, canais e modelos de negócio. Houve o maior número de transações envolvendo entrada de fundos, aberturas de capital, fusões e aquisições em empresas de varejo.
A maturidade do mercado pode ser constatada por grau de concentração; grau de internacionalização; número de empresas de capital aberto e com participação de fundos de investimentos; escala, abrangência e capilaridade de redes; presença de shopping centers e redes de franquias; grau de formalização, transparência e governança.
Em 2013 iniciou-se um novo ciclo, de Maturidade e Competitividade, no qual a desaceleração nas taxas de crescimento da demanda levaria as empresas a reduzirem seus processos de expansão e abrirem a agenda de eficiência e produtividade como prioridade para os negócios. Infelizmente, a combinação de erros de política econômica, descontrole fiscal, postergação de medidas estruturais necessárias, subordinação da agenda econômica do País à agenda política na eleição de 2014 e a crise política que se instalou a partir de 2015 desorganizaram a economia e destruíram a confiança. Como consequência, o que poderia ter sido uma aterrissagem suave se tornou um mergulho da economia e consumo, com reflexos no mercado de varejo.
Em 2015, o varejo caiu 4,3% no Brasil. Com exceção do segmento de farmácias e drogarias (que teve crescimento de 3%), todos os segmentos caíram, tendo como extremos negativos móveis e eletrodomésticos (-14%), livros e papelaria (-10,9%) e moda (-8,7%). No primeiro semestre de 2016 cenário piorou: o varejo caiu 7,3% no acumulado até maio.
A agenda de eficiência e produtividade deixou de ser prioridade estratégica para se tornar imperativo de sobrevivência.
O varejo não parou – a crise contaminou o humor e percepção sobre a economia brasileira e criou-se a idéia do varejo paralisado e retrocedendo. O Ranking das 300 maiores empresas de varejo da SBVC mostra realidade muito diferente. Apesar do cenário difícil, 102 empresas das 300 maiores cresceram acima de 10% no ano passado e 189 apresentaram algum grau de crescimento, enquanto 135 aumentaram sua base de lojas e 126 aumentaram o quadro de funcionários. Dentre as 100 maiores, 67 tiveram crescimento nominal de vendas e mais da metade aumentaram o número de funcionários.
O esforço das empresas fica claro ao se analisar os 20 maiores grupos de varejo no Brasil, que respondem por 20% do varejo nacional. Eles tiveram em 2015 7,1% de crescimento nominal no faturamento e aumentaram o quadro de funcionários em 0,23%, que significa ganho em eficiência e produtividade. A venda média por loja desses grupos aumentou 7,45% e a venda média por funcionário aumentou 6,85%.
Maturidade e regionalismo – o Ranking permite compreender diversas características do varejo brasileiro. A presença internacional ainda é limitada, porém vem crescendo em relevância. Apenas 18 das 100 maiores empresas do varejo brasileiro têm controle internacional, porém 5 delas estão entre as 10 maiores.
O grau de concentração também é limitado, visto que as 5 maiores empresas detém somente 10% do varejo brasileiro e as 50 maiores chegam apenas a 25%.
O grau de maturidade avança no grau de transparência e governança das empresas: há 29 delas de capital aberto e 55 com conselho de administração.
A escala e cobertura vem se ampliando e já existem 13 redes com mais de 1.000 lojas e 49 com mais de 300 lojas. De outro lado, há 109 empresas com faturamento acima de R$ 1 bilhão e 116 empresas com presença em mais de 5 estados. O Ranking revela a força do varejo regional no Brasil, pois 178 das 300 maiores empresas operam em até 3 estados. A dimensão territorial, grau de concentração geográfica e demográfica dos municípios brasileiros permite manter a relevância e espaço das empresas regionais. O franchising é a outra face da mesma moeda, pois permite ampliar o alcance e capilaridade de redes e há 43 empresas dentre as 300 maiores que operam predominantemente em modelo de franquias.
Legado positivo – os números do ranking reforçam a idéia de legado positivo da crise.
As perspectivas apontam para uma possível inversão de tendência no último trimestre de 2016, com possibilidade de crescimento a partir de 2017. Para que o cenário se realize, é fundamental que haja estabilidade polícia, governabilidade, equilíbrio fiscal e inflacionário e restauração da confiança. Este último ponto é o principal termômetro que definirá o tempo e magnitude da retomada para o varejo. O legado positivo virá da determinação e rapidez com a qual as empresas tomaram decisões difíceis desde 2015, que envolveram fechamento de lojas deficitárias, revisão de sortimento, renegociação de contratos, enxugamento de quadro, racionalização de processos e maior aplicação de tecnologia. O varejo brasileiro avançará 10 anos em 2 e o saldo da crise será um mercado mais competitivo, eficiente e com empresas preparadas para um novo ciclo de amadurecimento com maior produtividade, lucratividade e qualidade.