Em uma ação sem precedentes, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, produziu uma reviravolta, ontem pela manhã, ao divulgar nota em nome pessoal mudando o roteiro da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que começou ontem e termina hoje. A taxa básica de juros (Selic) pode ser mantida em 14,25% ao ano ou ter um aumento mais simbólico, de 0,25 ponto percentual, para não aprofundar a recessão e o desemprego que assustam o governo.
Na nota em que indicou a desistência de elevar os juros em 0,5 ponto percentual, para 14,75% ao ano – depois de reiterar essa perspectiva por dois meses consecutivos em todos os documentos do comitê – Tombini atribuiu tal decisão “às significativas” revisões de projeções de crescimento para o Brasil feitas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).
As previsões do FMI constam da atualização rotineira do relatório “World Economic Outlook”, divulgado ontem pela manhã. Os prognósticos tiveram uma piora considerável para o país: recessão de 3,5% em 2016, em comparação com a retração de 1% do relatório anterior; e estagnação em 2017, com zero de crescimento e não mais 2,3%. As projeções do Fundo, porém, são derivadas do que seus técnicos ouviram do governo, especialmente do BC, e dos seus interlocutores no setor privado. Não se pode afirmar que são indicadores melhores do que os produzidos aqui e nem que esses dados surpreenderam. O BC considerou a piora “rápida e pronunciada”, segundo a nota de Tombini, divulgada uma hora depois do relatório do FMI.
A notícia da mudança de postura do presidente do BC, que estava emparedado pelos documentos do Copom e por seus próprios pronunciamentos que sinalizavam elevação de 0,5 ponto percentual da Selic, coincidiu com a informação de que Tombini teria se encontrado com a presidente Dilma Rousseff na segunda feira. As assessorias de imprensa do Banco Central e do Palácio do Planalto desmentiram. Na semana passada também houve essa informação.
O fato é que na segunda feira fontes da presidência da República comentavam que os juros poderiam subir apenas 0,25 ponto percentual. Ontem, essas mesmas fontes mencionaram a hipótese de não haver aumento nenhum. Sempre citando que ambas as decisões do Copom seriam plenamente defensáveis já que mesmo os economistas mais ortodoxos do setor privado, a exemplo de Affonso Celso Pastore, vinham se manifestando contra mais uma rodada de aperto monetário. Comentaram, ainda, que a própria diretoria do Banco Central estava dividida e que um aumento de 0,5 ponto da Selic neutralizaria o esforço que o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, para reanimar a atividade econômica com um pacote de medidas, como as de expansão do crédito. Está claro para a presidente Dilma que este não será “um pacote milagroso” e que não terá impacto de curto prazo.
O fato concreto é que a economia encolheu cerca de 4% em 2015. A pesquisa Focus aponta para uma retração de 3% este ano, mas há economistas importantes do mercado já trabalhando com queda de 4% da atividade. E nada indica uma melhora para 2017, por enquanto. O desemprego aumenta de forma acelerada e isso assusta sobremaneira um governo já fragilizado política e popularmente e em meio à guerra contra o impeachment da presidente.
Se Tombini esteve ou não com Dilma, isso não impede que ele esteja totalmente ciente das dificuldades da economia e do governo. Tinha, por outro lado, suporte de parte dos economistas conservadores que achava que a elevação da Selic seria temerária para uma economia em profunda retração. Associado a isso, janeiro trouxe notícias preocupantes da desaceleração da China e Tombini esteve em recente reunião do Banco de Compensações Internacionais (BIS), onde se discutiu a piora do cenário externo. O crescimento chinês pode estar bem abaixo do que mostram os indicadores oficiais, algo como 3% a 4% na margem, o que exportaria uma desinflação para o resto do mundo.
Só não há explicação para a reação tardia do presidente do BC. Não houve deterioração adicional dos indicadores desde a divulgação da carta aberta ao ministro da Fazenda, no dia 8, em que o Copom explica por que a inflação em 2015 superou a meta. A taxa de câmbio está mais ou menos estável e o preço do petróleo teve queda substancial no mercado externo o que, em tese, ajudaria na queda da inflação.
Valor Econômico – SP