30/10/2015 20:00
// Por: Luiz Fernando Sá
Flávio Augusto da Silva é criador e criatura, autor e personagem. Especializou-se em contar a sua vida e a de vários outros com trajetórias semelhantes. E fez de seu sucesso um novo sucesso: é a estrela do momento no mundo do empreendedorismo. Para quem (ainda) não o conhece, eis o resumo de sua obra. Em 1995, aos 23 anos, Flávio investiu R$ 20 mil do seu cheque especial em uma escola de inglês (sem falar inglês), a Wise Up, transformou-a em uma rede de franquias que vendeu, 18 anos depois, por quase de R$ 1 bilhão.
Quem quer conhecer melhor pode consultar edições antigas da DINHEIRO, começando com uma busca no site www.istoedinheiro.com.br. Ou então, frequentar o universo digital que ele criou e que já atraiu mais de 2,6 milhões de pessoas e o tornou, aos 43 anos, uma das mais influentes vozes do mercado empresarial, uma espécie de guru de uma legião de jovens interessados em abrir seu próprio negócio. Acompanhe: a ponta de lança desse fenômeno é a Geração de Valor, página no Facebook que o colocou em contato direto com essa multidão. Cada postagem tem um engajamento médio de 30 mil fãs.
Em uma semana, as mensagens da GV (é assim que ele chama o espaço e os membros dessa enorme comunidade) alcançam entre 15 e 20 milhões de pessoas. A marca Geração de Valor batizou site, podcasts (mais de 1 milhão de ouvintes por semana), canal no YouTube (alguns vídeos com mais de 1,5 milhão de visualizações), eventos e até um livro, lançado em novembro do ano passado e que hoje, com mais de 150 mil cópias vendidas, está no topo da lista dos mais populares do segmento no País um segundo título está para sair do forno. E, como tudo que ele planeja vem bem amarrado, a página é também a principal vitrine do mais novo e ousado projeto de Flávio, o meu sucesso.com.
O que é isso? Explica aí, Flávio: É uma plataforma de tecnologia para compartilhar conhecimento, uma escola de empreendedorismo feita com base no estudo de casos, como são os MBAs de Harvard, mas com uma produção cinematográfica. Estamos criando o Netflix do empreendedorismo, disse ele à DINHEIRO. A analogia faz sentido. Assim como a empresa que está mudando a forma de se ver TV em todo o mundo, o meusucesso.com é um serviço por assinatura (R$ 65 por mês) que entrega conteúdo, sobretudo em vídeo de alta definição. A cada 40 dias, em média, a plataforma lança um estudo de caso, que começa a ser feito a partir de um documentário sobre a trajetória de um empreendedor bem-sucedido.
Durante esse período, o personagem é estudado a fundo. Além do filme, ele é questionado em entrevistas e as questões que ele levanta problemas de gestão, fluxo de caixa, vendas etc. servem de mote para uma série de outros conteúdos, como talk shows e vídeo aulas em vários formatos, seguindo um modelo pedagógico desenvolvido pela equipe da empresa. No total, são mais de 10 horas de vídeos disponíveis por caso. Quer saber quem foi o protagonista do primeiro documentário/estudo de caso? O próprio Flávio. Não é questão de autopromoção, mas de adequação ao projeto.
O Flávio é a metáfora perfeita desse negócio, com sua história rica de empreendedor, cheia de insights poderosos, com forte apelo inspiracional, afirma Sandro Magaldi, CEO do meusucesso.com. Depois dele, em cerca de um ano de operação, vieram mais 10 casos do ex-morador de rua Elói D’Ávila, que construiu a Flytour, uma das maiores operadoras de turismo do País, ao ex-músico Caito Maia, criador da grife Chilli Beans. No próximo dia 10, será lançado o 12º: Ozires Silva, fundador da Embraer. Cada documentário, segundo Flávio, tem orçamento em torno de R$ 500 mil, uma enormidade para os padrões da internet.
Todo minuto dos filmes é produzido por equipes próprias, mesmo que exija deslocamentos para outros países e equipamentos de ponta. Até mesmo a trilha sonora é criada especialmente para o case. Na sede da meusucesso.com um pequeno prédio envidraçado, quase despercebido em meio ao arranha-céus da Vila Olímpia, maior concentração de empresas de tecnologia por metro quadrado no País funciona um estúdio de última geração, com cenários para diversos programas, inclusive ao vivo, e equipamentos de ponta.
A pré-estreia dos documentários é um negócio dentro do negócio. Como a proposta é usar linguagem cinematográfica para contar a história dos personagens, o lançamento ocorre em um cinema. Magaldi fechou uma parceria com rede paulista Cinépolis e faz o evento em uma das grandes salas iMax da marca. As sessões ficam lotadas, com um público predominantemente jovem. O público assiste a uma versão reduzida, feita especialmente para a ocasião. Depois, Magaldi comanda um talk show ao vivo com o personagem da noite e outros convidados, numa comunicação direta com a plateia.
O clima é quase de pregação, a evangelização do empreendedorismo. Os fiéis, discípulos de Flávio que pagaram em torno de R$ 100 pelo ingresso, reagem bem e aprovam. No final, tietam os empreendedores. Flávio afirma ter investido, até agora, R$ 8 milhões no projeto, que envolve 80 profissionais. Na conversa com a DINHEIRO, no estúdio paulista, demonstra entusiasmo com os resultados da empreitada, que acompanha, na maior parte do tempo, à distância. Há seis anos ele vive, com a mulher e os filhos, fora do País.
Já morou nos Estados Unidos, Austrália e agora se fixou em Portugal, numa migração em busca de conhecimento. Ele enxerga o mundo com olhos de caçador em busca de oportunidades. Nos Estados Unidos, por exemplo, percebeu, levando os filhos à escolinha de futebol, o enorme potencial de crescimento do esporte por lá. Estudou o mercado e concluiu que valia o investimento. E que investimento. Pagou US$ 110 milhões para comprar o Orlando City, time da cidade onde morava na Flórida. Contratou o craque Kaká, comprou um lugar na MLS, principal liga profissional americana, e entrou em campo.
Este ano, seu primeiro na MLS, o time teve média de público de 33 mil pessoas por jogo e já conta com 41 patrocinadores. No ano que vem, inaugura estádio próprio, para 26 mil pessoas, ao custo de US$ 150 milhões. O futebol é o esporte que mais cresce nos EUA. Em cinco anos, o Orlando valerá US$ 1 bilhão, aposta. A escala dos valores envolvidos no meusucesso.com é bem menor. A ambição de Flávio com o projeto, não. Essa plataforma tem potencial global, afirma. A partir do ano que vem ele começa a replicar modelo e estrutura do negócio em outros países, a começar pelo Vale do Silício, berço do empreendedorismo digital na Califórnia.
Depois, no prazo de quatro anos, prevê a abertura de operações semelhantes na América Latina (Colômbia ou México), Alemanha, Emirados Árabes, Japão e Hong Kong, porta para o mercado chinês. As boas histórias estão em qualquer lugar. Vamos contá-las em qualquer idioma, diz. O Flávio é um líder e tem essa visão de que o legado do empreendedor é compartilhar o conhecimento, afirma Carlos Wizard Martins, ex-concorrente com trajetória parecida também começou do zero, fez fortuna com ensino de idiomas e vendeu a rede Wizard por valores bilionários que virou personagem de estudo de caso do meusucesso.com. Ele sabe o quanto custa um erro e se preocupa em encurtar caminhos para quem está começando um novo negócio agora.
A plataforma desenvolvida por Flávio tem também funcionalidades de redes sociais e permite a troca de experiências entre os assinantes, que podem também apresentar seus projetos em busca de dicas e, por que não, investidores. Em torno dele gravitam jovens que já são identificados como influenciadores da nova geração das redes sociais. Nomes como Bel Pesce (que ficou famosa com o blog e o livro A Menina do Vale, em que conta sua trajetória no MIT e no Vale do Silício), a dupla de blogueiros Jovem Nerd, o humorista e palestrante Murilo Gun (que já participou de encontros até na escola da Nasa) e Natan Gorin (empreendedor de 14 anos que já atriu a atenção de investidores) são figuras recorrentes no universo de Flavio, numa estratégia em que um divulga o outro e todos crescem organicamente nessa nova e poderosa mídia.
Negócios já surgiram nesse ambiente fértil. O próprio Flávio encontrou ali uma startup na qual decidiu apostar, uma câmera portátil desenvolvida por um brasileiro no Vale do Silício, que vem com um software que permite a autoedição dos filmes produzidos pelos usuários. Segundo ele, a Graava deve chegar em breve ao mercado. Distante em quilômetros, o criador do negócio é figurinha fácil na sua própria rede, assim como na página da GV no Facebook. Ele tem grande capacidade para liderar a distância e delegar quase tudo, menos a comunicação direta com o público, diz Magaldi.
E como comunicador, é um grande vendedor, envolvente e sempre preocupado em buscar conteúdo relevante para compartilhar. Quando começou a construir sua ampla comunidade digital, Flávio dedicava cerca de uma hora por dia a esse universo. Hoje, são pelo menos duas horas e meia. Em suas postagens, combina mensagens de, digamos, autoajuda empresarial, imagens com frases de efeito produzidas por ilustradores de sua equipe, trailers dos seus documentários e, sobretudo, textos opinativos. A linguagem é direta, com estilo coloquial e, por muitas vezes, evangelizadora. As opiniões, frequentemente, heterodoxas.
Nesta semana, por exemplo, criticou abertamente o que chamou de doutrinação marxista de 5ª categoria nas provas do Enem. O post teve mais de 40 mil curtidas. A educação, para ele, é tema mais do que recorrente, estratégico. Para Flávio, a escola, no Brasil, foi criada para fazer empregados e afastar os jovens do empreendedorismo. Mais que criticar, ele decidiu agir. Seus próprios filhos estudam em casa, em sistema de home school. E a missão que assumiu, após vender a Wise Up, foi criar novas formas de ensinar sua matéria favorita: fazer negócios.
Revista IstoÉ Dinheiro – SP