23/03/2015 às 05h00
Por Sérgio Lamucci | De Toronto, Ottawa, Montreal e Vancouver
Na acirrada disputa global pelo investimento em inovação, o Canadá se desdobra para atrair empresas estrangeiras, acenando com mão de obra altamente educada, impostos mais baixos, incentivos tributários para gastos em pesquisa & desenvolvimento (P&D) e acesso aos mercados dos Estados Unidos e do México. Um dos setores mais importantes é o de tecnologia da informação e comunicação (TIC), que engloba segmentos como os de serviços de software e computação, telecomunicações e multimídia. São 37 mil empresas, muitas de pequeno e médio porte, que empregam mais de 530 mil pessoas, espalhadas por cidades como Montreal, Ottawa, Toronto e Vancouver. Há também outros polos, como os de tecnologia médica e serviços financeiros. Especializada em efeitos visuais, a britânica Framestore abriu um escritório em Montreal em 2013, atraída em boa parte pela facilidade em contratar empregados especializados, segundo o vicepresidentesênior, Dennis Hoffman. A Grande Montreal conta com muitas empresas do setor de multimídia e cinco universidades, o que ajuda bastante no processo de recrutamento. “São profissionais talentosos, que precisam ser bem pagos”, disse Hoffman. Com dois Oscars no currículo, a Framestore tem hoje quase 200 pessoas trabalhando na unidade de Montreal, responsável por parte dos efeitos visuais que aparecem no filme “Robocop”, a refilmagem de 2014 dirigida pelo brasileiro José Padilha. Impostos mais baixos e custos competitivos também ajudaram a empresa a se decidir pela cidade canadense. O nível de escolaridade da população é um dos trunfos usados por Montreal e outras cidades para atrair investidores estrangeiros. Metade da população do Canadá em idade para trabalhar tem educação de terceiro grau, sendo a força de trabalho mais bem educada entre os países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). O ambiente educacional tem um peso decisivo para a forte presença das empresas tecnológicas no Canadá. Foi um fator importante para a canadense Ngrain, que trabalha com tecnologia interativa em 3D e realidade aumentada para aplicação industrial, ter nascido em Vancouver. A existência de universidades como a de Colúmbia Britânica (UBC, na sigla em inglês) é relevante para a Ngrain,segundo o diretor de desenvolvimento de produtos da companhia, Barry Po ele mesmo é PhD em ciência da computação pela UBC. Boa parte dos funcionários é formada por engenheiros. Fundada há 15 anos, a Ngrain tem entre seus clientes empresas americanas como a Lockheed Martin, do setor de defesa, e a Microsoft. A tecnologia da Ngrain permite visualizar não apenas a superfície de objetos, mas também detalhes no interior. No Brasil, a companhia atende empresas do segmento aerospacial, mas não revela quais. Vantagens tributárias também contribuem para trazer empresas estrangeiras ao Canadá. O imposto de renda corporativo é consideravelmente mais baixo que nos EUA, sendo o segundo menor do G7, maior apenas que o do Reino Unido. Além do fato de já ter clientes canadenses, impostos mais baixos foram um dos motivos que atraíram a sueca Syntronic para Ottawa, assim como o crédito tributário que pode ser obtido com gastos com pesquisa & desenvolvimento, segundo o diretorgeral da unidade no Canadá, Hans Molin. Especializada na elaboração de software eletrônico, técnico e administrativo para vários setores da indústria, a Syntronic abriu um centro de P&D na cidade em dezembro, contando com 30 funcionários, e tem planos de ter 120 em cinco anos. Como atrativos, Ottawa tem uma concentração elevada de empresas de alta em setores como tecnologia, defesa e tecnologia médica, segmentos importantes para a companhia. Molin destacou a facilidade de montar o negócio no Canadá, o que leva em média cinco dias, segundo o relatório Doing Business, do Banco Mundial. Conseguir crédito, porém, é mais complicado, de acordo com ele. “Eu ainda estou tentando obter um cartão de crédito corporativo”, exemplificou Molin. O rigor do sistema financeiro canadense, tido como bastante sólido, ajuda a explicar a dificuldade na obtenção de empréstimos. Com escritórios em países da Europa e também na China, na Malásia e na Indonésia, a Syntronic optou por Ottawa para montar o seu primeiro escritório na América do Norte. O mercado do Canadá em si é pequeno apenas 35 milhões de habitantes, num território de quase 10 milhões de quilômetros quadrados , mas o acesso franqueado aos EUA e ao México devido ao Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta, na sigla em inglês) é uma vantagem a mais para as empresas se estabelecerem no país, diz Stewart, da Invest Toronto. O Nafta tem 474 milhões de consumidores, numa região cujo Produto Interno Bruto (PIB) está na casa de US$ 20 trilhões. Os custos mais baixos no Canadá também são outro fator que pode atrair empresas para o país. “Um engenheiro de software ganha em média por ano 80 mil dólares canadenses [o equivalente a US$ 62,5 mil]. Em Los Angeles, pagase o dobro”, disse Kaiser Ng, diretorsênior de operações da Dena em Vancouver, empresa de origem japonesa que desenvolve jogos para tablets e celulares. Também influenciou a decisão da Dena os impostos mais baixos, os incentivos tributários e o fato de a cidade ter um polo importante de videogames, contando com empresas como Nintendo, Disney e Microsoft. Na província da Colúmbia Britânica, onde fica Vancouver, há mais de 600 empresas apenas na área de entretenimento digital e interativo, empregando 16 mil pessoas. O jornalista viajou a convite das agências municipais de desenvolvimento econômico de Toronto, Ottawa, Montreal e Vancouver
Valor Econômico – SP