05/03/2015 05:00
Por Juliana Elias
Não é apenas a renda ou a dependência maior de um ou outro serviço que faz diferença na percepção individual da inflação. O economista André Chagas, que coordena o IPCFipe, Índice de Preços ao Consumidor da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, lembra que outro elemento que desvirtua a inflação pessoal da inflação média é a disposição do consumidor em pesquisar preços e substituir ou abandonar marcas e produtos que estejam mais caros. Com base em diferentes índices de preços nos últimos anos, a Fipe chegou à conclusão de que, por não considerar a possibilidade de substituição, os índices de referência superestimam a inflação em 0,6 ponto por ano, em média. Isso significa que, se o IPCA foi 6,4% no ano passado, para um pessoa que deixou de comprar tomate ou passou a ir menos vezes ao cinema, por exemplo, ela pode ter sido de 5,8%. “As fórmulas não consideram que o consumidor substitua produtos ou comprem menos de alguma coisa”, diz. “Então, sim, é possível, como é na verdade muito provável, que o consumidor mais atento tenha inflação menor.”
Levamento feito pela Fipe a pedido do Valor mostrou que, em janeiro, dentro de uma mesma região da cidade de São Paulo, o valor para adquirir uma cesta básica pode ficar até 43% menor caso o consumidor garimpe opções mais baratas pelo bairro. É o caso da zona norte da capital, onde a cesta mais cara custaria R$ 511 e, a mais econômica, R$ 287,53. O preço médio na região era de R$ 382,09. O levantamento foi feito para uma cesta fixa, de 44 produtos, sempre da mesma marca, pesquisados em 88 mercados da capital e divididos em cinco regiões. Coxão mole, leite longa vida, alface e creme dental são alguns dos produtos. A cesta mais em conta reúne a versão mais barata encontrada de cada produto entre todas os mercados da região, e o mesmo, na outra ponta, para a cesta mais cara. É uma situação extrema e mais hipotética do que real, já que exigiria que o consumidor fizesse suas compras de três ou quatro lojas diferentes, mesmo que próximas.
Chagas destaca ainda que o levantamento não capta outras fontes de inflação, como custos diferentes por conta de aluguel mais caro ou serviço melhor. “Mas ir a diferentes locais, pesquisar diferentes marcas, ainda mais em um momento de aumento de preços, pode ser uma forma de escapar um pouco.” Isso, no entanto, não vale para todos os tipos de produto. Há alguns que não têm opção alternativa e outros que são mais difíceis ou simplesmente impossíveis de se abandonar, como aluguel ou conta de luz. Isso, diz o economista Samy Dana, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), deve fazer a inflação de 2015 especialmente mais difícil.
“A inflação está subindo, mas puxada por itens que não têm por onde correr, porque são serviços de utilidade muito básica”, disse Dana. Enquanto preços livres e de serviços começam a desacelerar, em 2015 a inflação deve ser puxada para cima por reajustes já ocorridos ou aguardados em serviços monitorados como energia elétrica, transporte público, gasolina e gás de cozinha. “É muito comum, em um primeiro momento, quando os custos aumentam, as pessoas diminuírem despesas como lazer, beleza, viagens”, diz Dana. “Mas, quando se fala em aumento de matrícula, gasolina, de luz, não há muita alternativa. A inflação acaba sendo quase como um imposto.”
Valor Econômico – SP